sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Ainda sobre o pequeno príncipe

Características de Estabilidade e Navegabilidade

Estabilidade estática

O gráfico ao lado mostra o braço de restituição para ângulos de adernamento de 0 a 180 graus. Que informações este gráfico nos dá a respeito da estabilidade do Cruiser? Em primeiro lugar, vemos que o barco tem estabilidade positiva até um ângulo de quase 120 graus, ou seja, até este ângulo, o barco retorna à posição vertical por conta própria. Além disso, comparando as áreas formadas pela curva acima e abaixo do eixo de GZ=0, vemos que a energia necessária para virar o barco (área da curva positiva) é bem maior que a energia para desvirá-lo, ou seja, em condições de mar capazes de provocar uma capotagem, o barco provavelmente retornará a posição correta por conta própria em pouco tempo.
righting-arm-webAlém disso, a inclinação do gráfico até 30 graus indica uma grande estabilidade inicial, que permite carregar mais área vélica ou suportar ventos fortes sem necessitar rizar as velas. A vantagem é óbvia: mais vento=mais velocidade.

Plano Vélico

pequenoprincipe135gaff
armação carangueja (gaff rig)
Duas opções de armação Sloop são oferecidas: uma com maior área vélica (11 m2) na vela grande e na genoa (com gurupés), mas com centro de esforço mais baixo. A segunda versão tem menor área vélica (9,3m2), melhor desempenho no contravento, mas o centro de esforço das velas está na mesma posição longitudinalmente, e você pode optar por qualquer uma delas sem precisar modificar a posição da caixa de bolina.
Outra opção é a armação Catboat, muito popular fora do Brasil, em especial nos EUA. Uma única vela carangueja é armada num mastro montado quase na proa. Vantagens óbvias: cabine sem obstrução do mastro e simplicidade para armar e velejar.
O catboat é um barco de pesca e trabalho que foi muito utilizado na região de Cape Cod (Nova Inglaterra, EUA) no século XIX e começo do século XX, por sua estabilidade, capacidade de carga e facilidade de navegação, e após os anos 50 voltou a se tornar popular, desta vez como veleiro de recreio. É uma armação que tem como principal vantagem a facilidade de navegação em especial quando o barco é tripulado por uma pessoa apenas.
Apesar da maioria absoluta dos veleiros brasileiros utiliza velas grandes triangulares (bermuda rig), preferida em regatas devido ao melhor desempenho no contravento, mas a vela carangueja (gaff rig) é a que oferece melhor eficiência no vento de popa e de través. Como este não é um veleiro para regatas, preferi utilizar este tipo de vela, já que as suas vantagens, em minha opinião, compensam a sua deficiência na orça fechada.
Área Vélica e Centro de Esforço Lateral
lead_135Na figura ao lado você vê o plano vélico do Cruiser 135, agora batizado, por vocês, de Pequeno Príncipe. O Pequeno Príncipe dos mares é um veleiro diferente, porque seu projeto foi feito a partir de constantes pesquisas e enquetes com os leitores do site, e seu desenvolvimento levou em conta o compromisso entre custo, segurança e facilidade de transporte, guarda e uso, para ser um primeiro veleiro ideal para quem quer construir seu primeiro barco.
A idéia é que ele seja um veleiro ideal para o aprendizado, tanto da arte de contrução de veleiros em compensado  naval, quanto da arte de velejar.
A Área vélica é de 10m2, e a armação Gaff Rig (carangueja) tem um centro de esforço mais baixo, permitindo maior área vélica com menor adernamento. A armação escolhida também tem melhor desempenho em ventos de través e popa, perdendo para a armação marconi (sloop) apenas na orça fechada.

Os numeros do pequeno príncipe

Os Números do Pequeno Príncipe 135

Como havia prometido, aí vão os primeiros números do Cruiser 135, para que vocês possam ter uma primeira idéia das características e dimensões do barco, e uma primeira estimativa de desempenho e características de estabilidade. Coloquei também alguns desenhos do casco em 3D, feitos num software de projeto naval.
tela do FreeShip, onde o projeto está sendo desenvolvido
render-pequeno-principeComo se vê acima, trata-se de um casco de planeio e baixo calado. Mais detalhes abaixo:Comprimento na linha d´água:      3.629 [m]
Comprimento total:      4.233 [m]
Boca na linha d´água:      1.619 [m]
Boca:      1.816 [m]
Calado (sem bolina) :      0.22
Nesta configuração o barco desloca 600 kg, peso elevado para um pequeno veleiro. Supondo que ele tenha cerca de 120kg de lastro, e pese cerca de 150kg (casco), temos uma carga útil de quase 330kg. Permite, assim,  fazer velejadas mais longas levando água e mantimentos.
Coeficiente de bloco :        0.4659
Coeficiente prismático :        0.6155
O casco tem generosas superfícies planas, para permitir maiores velocidades em regime de semi-planeio, e o coeficiente prismático é elevado devido às dimensões da popa.
lateral-casco-cruiser-webEstes são apenas dados preliminares obtidos da análise da hidrostática d0 primeiro esboço do casco. Este terá que ser desenvolvido ainda, para que depois se faça o projeto do plano vélico, e depois da quilha e do leme. Apenas após a conclusão desta etapa será possível iniciar os desenhos técnicos, de construção.
Fiquem ligados nas próximas notícias para saber das novidades. Na próxima parte, primeiras estimativas de estabilidade do Cruiser 135.  http://gustavodantas.wordpress.com/projeto-cruiser/dimensoes-area-velica-cruiser-135/


Pequeno príncipe 135

Finalmente, um veleiro na medida para o construtor artesanal de barcos brasileiro!

pequenoprincipe135gaffDepois do sucesso do CD de projetos de veleiros para construção artesanal, decidi iniciar um projeto próprio, unindo o conhecimento adquirido em anos de pesquisa sobre o tema às minhas próprias idéias sobre como deveria ser um veleiro capaz de unir 3 características básicas: Baixo custo, facilidade e rapidez de construção, e compromisso aceitável entre conforto e desempenho. Explicarei melhor estes 3 itens abaixo:
  1. Baixo custo: se você tem dinheiro na conta, siga o conselho de um amigo meu, que comprou um casco Bruce Roberts 35 e o reformou inteiro, “não construa, compre pronto e vá velejar!” É claro que não construímos barcos apenas porque não podemos gastar, a construção de um barco, como de qualquer outra coisa (uma casa, um carro, seus próprios móveis), dá ao construtor uma dignidade e orgulho ao ver sua obra pronta e servindo, que não se pode comparar com nada que se compre. Mas quando se fala de um veleiro pequeno, digamos, de 16 pés, não vale a pena construí-lo se ele custar mais que 5000 reais, porque com esta quantia você pode comprar um Paturi usado. A não ser, claro, que você queira construir um barco específico, um desenho mais clássico, ou um layout específico, mas na faixa de 16 pés, o grande chamariz de um projeto para construção artesanal é o baixo custo e a simplicidade, para que o projeto sirva de escola para construtores iniciantes, que dispõe de pouco capital e pouco tempo disponível.
  2. Simplicidade e rapidez de construção: para um construtor amador, que procura seu primeiro veleiro para construir em compensado naval, um projeto deve ser simples e rápido, ou seja, o método de construção deve permitir que uma pessoa, sozinha, possa executar a maior parte da construção, excetuando a eventual viragem do casco, e instalação da quilha ou do lastro. Além disso, o melhor método é o que combina baixo custo de material com menor número de peças e simplicidade nas formas. É possível construir um casco muito barato usando tábuas parafusadas sobre cavernas e fundo chato, porém, a vedação e acabamento das tábuas, assim como a montagem de numerosas cavernas, pode prolongar a construção em demasia. Cascos de compensado naval sobre cavernas temporárias, como o Sztrandék, ou em “stitch-and-glue”, como o Vagabond 23, são simples de construir e utilizam poucas placas de compensado em comparação com, por exemplo, um Multichine 23 (projeto do Cabinho) ou um Pilgrim 590, que utilizam anteparas de compensado naval para apoiar as longarinas e o casco.
  3. Compromisso entre desempenho e conforto: a não ser que você seja um regateiro convicto, um veleiro deve oferecer um compromisso entre velocidade e conforto. Ou seja, se for muito lento, a tripulação vai ficar muito cansada até chegar ao destino, e uma tripulação cansada e desatenta é um problema para a segurança da velejada. Por outro lado, barcos de regata, com grande estabilidade de desenho e cascos de planeio, cockpits amplos e leves, tendem a ser duros em mar agitado, e não oferecem muito espaço se você quer um pernoite com algum conforto, e itens tais como beliches, cozinha, WC, e assim por diante. Mas aí trata-se de gosto pessoal. Eu pessoalmente prefiro um barco que permita viagens mais ou menos prolongadas, com conforto (tanques de água com uns 50 l, geladeira 12V ou caixa de gelo, fogão, WC, ducha no cockpit, etc.) e pé direito que permita, ao menos, ficar sentado nos beliches sem bater a cabeça no teto. Por outro lado, um barco deste tamanho tende a ser lento, devido ao seu comprimento, e por isso o casco deve permitir um desempenho razoável em planeio, embora cascos de planeio com popa muito larga sejam duros em mar agitado.
Assim o projeto Cruiser será o barco ideal para o construtor iniciante de veleiros, e será também um excelente veleiro para o velejador iniciante, já que terá um desenho voltado à estabilidade, segurança, conforto, que um velejador solitário poderá velejar com tranquilidade, sem catracas, tralhas e itens caros na mastração e velame. Enfim, a idéia é projetar um barco que seja fácil e barato de construir (abaixo de 3000 reais), que possa ser feito em pouco tempo (menos de um ano, utilizando apenas os fins de semana), e que seja divertido e confortável para um casal passear durante o fim de semana, sem precisar atracar.

Primeiros esboços

A partir da proposta inicial apresentada nos artigos anteriores, e dos resultados parciais da pesquisa feita com os leitores, desenvolvi os primeiros esboços e plano de linhas, e defini as caracterísiticas básicas do pequeno veleiro.
Em primeiro lugar, mudou bastante o desenho do casco e o layout interno. Os esboços mostrados nos artigos anteriores (partes 1 e 2) apresentam dois beliches, com bolinas basculantes sob cada um, para eliminar uma caixa de bolina no meio do salão. Entretanto, devido à pequena boca, e ao pé direito limitado devido ao tamanho do veleiro, optei por eliminar beliches e deixar o piso da cabine sem qualquer saliência ou obstrução. Assim, os tripulantes podem se sentar ou deitar livremente no piso. A caixa de bolina volta à posição central, para deixar espaço generoso para pernoite (dois metros de comprimento e 80cm de largura na parte mais larga). Lembrem-se, não dá para fazer milagres com uma cabine de 2m, e não se pode simplesmente fazer uma cabine de um 24 pés em miniatura, já que os tripulantes não podem ser encolhidos.
Quanto à cozinha, WC químico e caixa de gelo, ficam todos escamoteados sob o cockpit e nos armários laterais. O fogão pode ser um destes de camping, que fica de pé no armário, e se apóia sobre uma mesa basculante, e caixa de gelo e WC correm de compartimentos sob os bancos do cockpit para dentro da cabine. Os colchões são segmentados, e a parte que fica junto à antepara pode ser retirada e apoiada no costado para servir de encosto, quando os tripulantes estiverem sentados.
Vantagens: mais espaço para deitar e se mexer, pé direito baixo mas que permite sentar sem bater a cabeça no teto, menor complexidade, menor número de peças, menor custo, mais praticidade.
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plano de linhas do Cruiser 135
Quanto ao desenho do casco, optei por um casco de planeio, com popa larga, claramente esportivo. Por quê? Ora, quanto menor o comprimento na linha d’água, menor a velocidade máxima do casco (em deslocamento). Num barco deste LOA, a velocidade do casco fica por volta dos 5 nós, independentemente dos ventos. Porém, com um casco de deslocamento esta velocidade pode ser grandemente ampliada, como ocorre com os daysailers e barcos de regata. Além disso, um cockpit largo devido ao desenho da popa, oferece mais espaço para tripulantes e para armazenar motor de popa, velas, mantimentos, etc.
O comprimento, de 4,2m, foi escolhido porque permite montar as placas laterais do casco com apenas uma emenda (compensado naval vem em chapas de 2,2m x 1,6m), reduzindo tempo de construção e desperdíio de material. Aliás, tudo neste barco foi pensado para oferecer menor custo e maior simplicidade sem prejuízo do desempenho, diversão, segurança e praticidade. É claro que concessões tiveram que ser feitas no que se refere a conforto, pelos próprios limites de espaço definidos pelas dimensões. Porém, como se verá, a praticidade e versatilidade deste projeto mais do que compensam suas limitações.
plano_velico_cruiser_135
esboço do plano vélico do Cruiser 135
Quanto ao plano vélico, notem a semelhança da armação “gunter rig” com a armação “marconi” (sloop). Esta armação reúne as vantagens da marconi na orça fechada com o menor custo da armação carangueja (”gaff rig”, pouco conhecida no Brasil). Por dispensar trilhos, cruzetas, e uma série de equipamentos e assessórios caros, o “gaff rig” é muito atraente. Você pode fazer as velas em casa, assim como mastro, retranca e verga. Por este mesmo motivo optei por um perfil clássico, apesar do casco ter um desenho moderno.
Quanto ao método construtivo, estou ainda decidindo entre “stitch-and-glue” (costure e cole) e algo semelhante ao Sztrandék, sem cavernas, com as placas do casco fixas sobre longarinas apenas. O primeiro tem a vantagem de ser mais rápido e fácil de montar o casco, mas exige mais tempo fibrando o casco, fazendo as emendas, e depois lixando tudo. O método de casco sobre longarinas sem cavernas dá mais trabalho, já que exige anteparas temporárias para posicionar as longarinas, mas dispensa a fibragem no casco todo. Basta selar com epóxi, dentro e fora. A fibra pode ser aplicada na parte submersa para aumentar a resistência e evitar a infiltração de água após algum choque no casco. Este método também me parece ter um custo menor, já que a resina epóxi é cara.  https://gustavodantas.wordpress.com/projeto-cruiser/